Quando um familiar passa a não conseguir cuidar da própria vida, seja por motivo de doença, deficiência, idade avançada ou até abandono, a família costuma se perguntar: “Posso interditar?”, “Preciso de tutela ou curatela?”. Por isso, compreender a diferença entre interdição, tutela e curatela é essencial para proteger a pessoa vulnerável sem violar seus direitos.
A legislação brasileira trata do tema principalmente no Código Civil, no Código de Processo Civil e no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que alterou profundamente o conceito de capacidade civil.

Entenda a diferença entre interdição, tutela e curatela e saiba quando cada uma se aplica
O que é interdição?
Em termos práticos, interdição é o procedimento judicial em que o juiz reconhece que uma pessoa não consegue, total ou parcialmente, exercer sozinha os atos da vida civil, nomeando alguém para representá-la ou assisti-la.
O Código de Processo Civil, nos arts. 747 a 758, regula o procedimento da ação de interdição. Nessa ação, um familiar ou o Ministério Público pede ao juiz que declare a incapacidade relativa ou a necessidade de apoio, indicando quem deve assumir a função de tutor ou curador, conforme o caso.
Depois do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a interdição não pode mais retirar todos os direitos da pessoa com deficiência automaticamente. Hoje, o foco da lei é a autonomia, garantindo apoio apenas naquilo em que a pessoa efetivamente precisar.
Tutela: proteção de crianças e adolescentes sem poder familiar
Em primeiro lugar, é importante entender que a tutela se relaciona, principalmente, com crianças e adolescentes.
De forma objetiva, a tutela ocorre quando a criança ou adolescente não está sob o poder familiar dos pais, seja porque:
- os pais faleceram;
- os pais perderam ou tiveram suspenso o poder familiar;
- há situação excepcional prevista em lei.
O Código Civil, nos arts. 1.728 a 1.766, disciplina a tutela. Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) reforça a proteção integral de crianças e adolescentes, garantindo o melhor interesse do menor.
Assim, o tutor:
- representa a criança ou adolescente nos atos da vida civil;
- administra seus bens;
- responde por sua proteção, educação e bem-estar.
Portanto, a tutela não é uma simples “ajuda”: é um encargo jurídico com deveres e responsabilidades, sempre fiscalizados pelo Ministério Público e pelo Judiciário.
Curatela: apoio à pessoa maior que não consegue gerir seus atos sozinha
Por outro lado, a curatela se aplica, em regra, a pessoas maiores de 18 anos que não conseguem, total ou parcialmente, administrar a própria vida ou seus bens, em razão de:
- doenças que afetem a capacidade mental;
- deficiências que comprometam a compreensão ou expressão de vontade em determinados atos;
- vícios graves (como tóxicos), em situações previstas em lei.
O Código Civil, nos arts. 1.767 a 1.783-A, trata da curatela. Já o Estatuto da Pessoa com Deficiência deixa claro que:
- a deficiência não afeta, por si só, a plena capacidade civil;
- a curatela é medida extraordinária e proporcional às necessidades da pessoa;
- a curatela não alcança direitos existenciais, como casar, constituir família, votar, entre outros, salvo decisão judicial específica e fundamentada.
Assim, o curador:
- administra bens e finanças;
- assiste ou representa a pessoa em determinados atos patrimoniais;
- deve sempre prestar contas e agir em favor do curatelado, nunca em interesse próprio.
Interdição, tutela e curatela: quais são as principais diferenças?
Para facilitar a compreensão, veja as diferenças em linhas gerais:
- Interdição
- É o processo judicial que pode resultar na curatela (para maiores) ou, em situações específicas, na definição de quem exercerá tutela (no caso de menores).
- O juiz analisa laudos médicos, provas e ouve a própria pessoa antes de decidir.
- Tutela
- Protege crianças e adolescentes que não estão sob poder familiar.
- O tutor passa a representar o menor em todos os atos da vida civil, com base no melhor interesse da criança ou adolescente.Está com dúvidas sobre seus direitosReceba orientações iniciais e entenda o que fazer no seu caso.Solicitar orientação
- Curatela
- Protege maiores de idade que não conseguem gerir sozinho seus atos patrimoniais.
- O curador não deve substituir completamente a vontade da pessoa, mas apoiá-la dentro dos limites fixados na sentença.
Dessa forma, ao analisar cada caso concreto, o juiz verifica a idade, a situação familiar, a capacidade de entendimento e a necessidade de apoio, definindo a medida mais adequada.
Quando a família pode pedir interdição e curatela?
Na prática, a família costuma procurar a Justiça quando percebe que o parente:
- assina contratos sem entender o conteúdo;
- faz empréstimos ou compras por impulso;
- é facilmente enganado por terceiros;
- não consegue administrar aposentadoria, salário ou bens;
- apresenta doenças como Alzheimer, demência, sequelas de AVC, transtornos psíquicos graves, entre outras.
Nesses casos, um familiar próximo (como cônjuge, companheiro, pais, filhos ou irmãos) pode propor a ação de interdição, com pedido de curatela, com fundamento no CPC e nos arts. 1.767 e seguintes do Código Civil.
Em geral, o processo exige:
- laudos médicos atualizados;
- relatos familiares sobre a rotina e as dificuldades;
- oitiva da própria pessoa, sempre que possível, para garantir respeito à dignidade e à autonomia.
Quais são as responsabilidades do tutor e do curador?
Tanto o tutor quanto o curador assumem responsabilidades importantes. Entre elas, destacam-se:
- cuidar do bem-estar da pessoa sob tutela ou curatela;
- administrar com zelo os bens, rendimentos e patrimônio;
- prestar contas ao juiz, quando necessário;
- não usar os bens do tutelado ou curatelado em benefício próprio.
A legislação protege a pessoa vulnerável, mas também exige compromisso de quem assume o encargo. Em situações de abuso, omissão ou desvio de bens, o juiz pode afastar o tutor ou curador e nomear outra pessoa, além de aplicar sanções.
Como funciona o processo na prática?
Em termos práticos, o caminho costuma ser o seguinte:
- A família procura um advogado ou a Defensoria Pública para avaliar a situação.
- O advogado propõe a ação de interdição, com pedido de tutela (se for menor) ou curatela (se for maior).
- O juiz determina perícia médica ou psicológica, ouve a família e, sempre que possível, a própria pessoa.
- Após analisar as provas, o juiz decide se há necessidade de tutela ou curatela e define os limites da medida, deixando claro em sentença quais atos exigem representação ou assistência.
Portanto, não se trata apenas de “tomar a assinatura” de alguém, mas de ajustar a proteção jurídica à real necessidade da pessoa, preservando ao máximo a sua autonomia.
Quando procurar ajuda jurídica?
Se você percebe que um familiar não consegue mais administrar a própria vida financeira ou civil, ou se uma criança ou adolescente está sem a proteção dos pais, você pode e deve buscar orientação jurídica.
Um advogado especializado em Direito de Família e Sucessões poderá:
- analisar o seu caso concreto;
- indicar se é caso de tutela, curatela ou outra medida de proteção;
- conduzir a ação de interdição com base nas leis vigentes, respeitando a dignidade e os direitos da pessoa envolvida.
Dessa forma, você protege quem ama e, ao mesmo tempo, age em conformidade com o ordenamento jurídico, que hoje busca equilíbrio entre autonomia, apoio e proteção.
Saiba mais:
Divórcio e Bens Financiados: Como Funciona a Partilha
Como Realizar a Adoção de uma Criança no Brasil – Carlane Portela


